17 de fevereiro de 2010

A alameda das cartas

Existe sim um lugar, não nesse mundo de homens, onde todas as cartas não enviada (ou então aquelas que desejaram enviar, mas nem escritas foram) são destinadas.
A carta a seguir não tem remetente e está destinada à "Você" (está realmente escrito "Você" no envelope, acreditem)

Você sabia que eu te amava? Amava de amor mesmo! Um amor de amigo, de companheiro, de amante... um amor meio louco, é verdade... mas nem por isso deixava de ser verdadeiro! 
Sabe, tive vontade de me declarar uma porção de vezes... mas não tive coragem... 
Sou um tolo sim! Eu mesmo me considero um tolo! Mas minha tolice devia-se ao fato de temer perder sua companhia, sua amizade.
Era engraçado o modo como eu ficava ao te ver... lembro da primeira vez em que saímos (só como amigos)...
Minha boca secou na mesma hora em que meus olhos avistaram os seus. Foi tão mágico e especial para mim. Lembro até que alguém chegou a comentar como eu estava tremendo... e eu estava mesmo! Disfarcei falando que era fome...
Sou de fato um tolo! As vezes acho que devia ter me arriscado sim, sabe? Para que pelo menos eu pudesse dormir com a cabeça mais leve.
Não que eu reclame de ter só sua amizade. Pelo contrário! Adoro conversar com você... olhar nos seus olhos e saber o que realmente está se passando.
Te conheço tão bem... Acho que te conheço mais do que me conheço. É por isso que eu me julgava ser o seu companheiro ideal. Saberia como cuidar de você... como te acolher em um momento difícil.
Mas nem sempre o que queremos é que é o certo.
Não entenda isso como uma desistência do meu amor por você. Não! Eu nunca vou deixar de te amar. Pode passar um mês, um ano, dez anos... mas eu nunca vou deixar de gostar de você.
Você foi a primeira pessoa que parecia me completar realmente. Então por isso eu acho que vai doer muito a cada vez que eu ver você com seu novo amor.
Saberei superar, mas nunca deixarei de te amar.
Tenho a total consciência de que se você estalar os dedos me chamando eu irei até você (não me envergonho por isso não)
Se alguém me perguntasse qual foi o amor da minha vida, sem dúvida a resposta seria você. Sempre!
Não consigo explicar, mas é algo maior! E pode parecer estranho eu ficar afirmando que te amo, amo, amo... mas acho que essa é a palavra...
Passei da fase da simples paixão. Não posso dizer só que "gosto" de você. Então melhor termo seria "amar".
Relendo essa carta agora, vejo quantas reticências eu usei. Reticências é um sinal de que as coisas ainda continuam... (mais uma)
Enfim, espero que você não ache piegas e nem dramática essa carta. São apenas sentimentos que ficaram guardados durante um bom tempo no meu peito. Espero que continuemos amigos mesmo depois dessa declaração.
Nem estou acreditando que tive coragem de me declarar! É um passo muito grande pra mim! Mas também se eu não o fizesse, não estaria sendo eu...
Me despeço agora desejando tudo de melhor para nós dois. 
Um abraço de alguém que te admira.


Engraçado, acho que quem escreveu a carta desistiu de dar o passo importante que tinha resolvido.
Enfim, voltarei a cuidar da alameda das cartas e quando houver alguma interessante como essa, eu venho lhes contar.
Fiquem com seus protetores e se lembrem: Nenhum sentimento é pequeno demais para ser dispensado numa folha de papel. Alguém sempre vai saber.

14 de fevereiro de 2010

Madame Bonheur (continuação)

[Para a anônima (risos) que me pediu uma continuação através do comentário]

Era final de tarde e a menina passava em frente a uma praça. Parou. Viu que umas crianças brincavam nas gangorras, uns idosos alimentavam os pombos e o sorveteiro, vestindo seu único jaleco azul, personalizado com seu nome, já estava empurrando seu carrinho, indo embora. Ela resolveu sentar em um dos bancos. Ficou admirando o rosado pôr-do-sol.
As palavras da Madame Bonheur ficaram rondando sua mente...
"Sua felicidade é você quem faz!"
E mesmo desacreditada, mas já resolvida que faria aquilo, a menina decidiu que aquele era o momento em que ela teria que começar a agir.
Buscou em sua mente quem a fez feliz. Ela queria que viesse uma resposta rápida. Alguém que ela tivesse amado. Amado mesmo, com todas as forças.
Vieram os amigos, os familiares, mas ninguém que ela realmente tivesse amado.
Pensou com ela mesma que aquilo seria bobagem e que cartomantes não passam de charlatãs.
Voltou a olhar a paisagem e notara que já havia anoitecido. Ficou olhando as estrelas e por um motivo que nem ela mesma sabe, procurou com os olhos as Três Marias e logo se lembrou de um velho amigo que a ensinara que elas faziam parte do cinturão de Orion. Logo um sorriso surgiu em seu rosto. Nem ela entendeu direito.
Voltou pra casa.
No caminho lembrou do seu primeiro amor. Amor verdadeiro. Daqueles que dói só de lembrar. Ela tinha 15 anos, ele já ia fazer 17. Uma lágrima escorreu no canto do rosto.
Pegou o ônibus.
Ao ver uma criança comendo pipoca, sentada a sua frente, se lembrou de seu aniversário de 10 anos. Todos os amiguinhos cantando "Parabéns a você" em volta do bolo. Ela com vergonha foi parar em baixo da mesa na hora do "Com quem será?". Outro sorriso surgiu.
Foi nesse mesmo aniversário que ela havia dado seu primeiro beijo. Um selinho, em um menino que ela gostava, mas tinha vergonha de gostar. Se lembrou de como ficou com vergonha. Riu sozinha no ônibus.
Passou na rua um rapaz que carregava um buquê de rosas. Ela se lembrou do último rapaz que dizia ter a amado. Dessa vez não houve lágrimas, nem sorrisos. Ela só lembrou.
O ônibus parou no sinal e pela janela ela viu um muro pichado com a seguinte frase "Ser feliz sem motivo é a mais autêntica forma de felicidade.".
Coincidência?
Talvez sim... talvez não...
O fato é que naquele momento a menina realmente se deu conta de tudo o que havia passado.
Ela não precisava de alguém que a amasse desesperadamente, como ela queria. Ela não precisava amar alguém desesperadamente.
Ela tinha é que se permitir ser amada, amar e principalmente se amar.
Seus amigos e familiares eram sua melhor companhia.
Não que não precisasse de um "amor", afinal, todos precisamos, mas ela chegou a conclusão que existem várias formas de amar.
Ela não se decepcionou com isso, pelo contrário. Foi reconfortante.
Agora sim ela entendia o que a cortomante queria dizer.
Prometeu a ela mesma que daria chances de ser feliz. Não ia deixar passar uma oportunidade. Ia tentar ser feliz do jeito que tivesse de ser.
Quanto ao amor?
Ela agora queria dar chance a ela mesma. Se alguém falasse que a amava ela também amaria esse alguém. Ou pelo menos tantaria.
Para ela agora só importava uma coisa: só queria não deixar de ser feliz.